Diário do Purgatório © 2012 - 2014
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"Ever tried. Ever failed. No matter. Try again. Fail again. Fail better." Samuel Beckett
por Fernando Lopes, 17 Jul 12
Álvares Cabral, a rua onde habitei durante trinta anos tinha uma curiosa mescla social. Em grandes mansões, com enormes jardins traseiros, vivia gente discreta e abastada. Nas outras casas de dimensão média, uma infindável horda de mangas de alpaca e donas de casa. Lado a lado, sem conflitualidade social e numa contida convivência. Todos sabíamos quando ia sair a viúva do dono dos Grandes Armazéns do Norte. Era a única que tinha motorista, rigorosamente equipado, boné incluído, tirava o carro para cima do passeio e ia ajudar a anafada senhora a entrar para o vistoso automóvel, o maior e mais bonito daquelas bandas.
À minha frente morava o Sr. Ramalhão. Vivia amigado (como dizia a avó), com a D. Palmira, uma senhora discretíssima e simples. A avó aconselhava-a a casar, pois se o seu companheiro morresse ficaria desprotegida. Os seus esforços de casamenteira foram infrutíferos e a D. Palmira faleceu antes do seu amado. Abatido e doente, passava os dias à janela, com um boina que tirava respeitosamente para cumprimentar a vizinhança que subia e descia nas tarefas diárias. Eu, adolescente, não perdia a oportunidade de trocar dois dedos de conversa, talvez porque gostava dele, talvez porque fui ensinado a respeitar os mais velhos, talvez porque me impressionava a sua solidão. Fez questão de me emprestar um livro que o tinha impressionado particularmente, "Erros Judiciários" de René Floriot.
Um dia, ao chegar do liceu, dei com a rua pejada de carros de luxo. Contou-me a avó que eram os sobrinhos e herdeiros do velho Ramalhão. Só nessa altura soube que aquele homem simples e conversador era proprietário de um grande armazém de colchas, atoalhados e artigos para o lar, ali para os lados do Largo dos Lóios. Diziam as vizinhas que os sobrinhos que nunca o visitavam, tinham aparecido devido à sua enorme fortuna, "mais de 600.000 contos!". Fui ao funeral, e ao ver tanto luxo, tanto requinte, não pude deixar de pensar naquele homem só, mendigando cinco minutos de atenção. Ainda o corpo estava quente e já todos os vampiros planavam, à espera do seu quinhão. Inevitavelmente, há gente que tem mais valor morta do que viva.
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A quantidade de informação retida no subconsciente é de facto um assombro! E realmente não somos grande bisca enquanto por cá andámos excepto quando morremos e mesmo assim depende da conta bancária de cada um...
No meu caso tenho quase a certeza de quando chegar a altura só estarão aqueles que realmente tinham alguma relação de empatia e quanto aos restantes até agradeço a sua ausência...
Abraços de um que ainda esperneia...;)